12.16.2004

 

Balada do Arco-da-Velha

Por Tales Lima Carrão
SESC Interlagos, manhã de quinta-feira. Convidado a participar e a cobrir um evento de "responsabilidade social", fui obrigado a estar às 10h00 nessa localidade, situada ALÉM da linha de trem que segue para o Grajaú, Embu-Guaçú e etc. Confesso que não fui com a melhor das disposições, mas não considerei nada de grave, até que chegasse o momento.
O ginásio do evento estava lotado, com mais de 400 anciões. No centro, um pequeno coro de 20 velhinhos cantava (na verdade não ouvi a voz de nenhum), comandados por uma alemã albina de 2,05 m de altura, com bochechas rosadas e expressão de 'fraulein'. Enquanto cantava com uma voz espetacularmente estridente, a alemã balançava freneticamente os braços e dava saltinhos, assustando e inibindo o coro de velhinhos, que permanecia imóvel e calado.
Num dado momento, resolvi que chamaria meu avô, de 84 anos, para a balada. Entretanto, lembrei que certa vez ele me dissera que não saía com mulheres mais velhas, e desisti da idéia.
Após o coro, um velhinho recitou em altos brados uma poesia improvisada, na qual contei a palavra Jesus sendo repetida 57 vezes. Depois uma senhora cantou "Brasil, Brasil", mas embora o refrão sugira a repetição da palavra apenas 2 vezes, cada refrão dela continha um número indefinido de repetições.
Quando vi as meninas que estavam fazendo a organização do evento, imediatamente mudei de lugar, sentando-me ao seu lado. Conversa vai, conversa vem, e nada, não sairia mato daquele coelho. Consultei a programação, mas não achei especificidades sobre as apresentações, então perguntei para uma das meninas. A próxima atração era o "grupo de percursão". Nesse exato momento, o "vibracall" do meu celular chamou, atendi (arrã..) e disse as meninas que precisaria ir embora.
Bem, no dia em que eu passar dos 80 anos, se isso acontecer, prometo que irei todos os dias à praça, jogar dominó. Afinal, os idosos tem que ser respeitados, mas não há nenhuma lei que nos obrigue a ouvi-los cantando.
Tales Lima Carrão é puxador da escola de samba dos velhinhos genocidas da colônia Menguele. Aos 22 anos, em estágio alcóolico avançado, beijou um esfregão e um tambor de lixo, ao confundi-lo com a mina que tinha acabado de xavecar.

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